O viés da confirmação

O viés da confirmação

Vamos ser sinceros: hoje, todos nós ficamos sabendo sobre o acontece no mundo através das redes sociais. Claro, ainda há os que assistem noticiários, os que leem jornais de cabo a rabo e aqueles que buscam sites de notícias de credibilidade comprovada. Mas, em termos gerais, é difícil negar minha afirmação inicial. Como o Facebook e o Twitter possibilitam a divulgação de fatos em grande velocidade, acabamos nos informando por eles. É o jornalismo de timeline. E imagino não estar exagerando se disser que, para uma imensa quantidade da população, isso é suficiente. Essas pessoas absorvem apenas o conteúdo que veem em seu feed e, pronto, acreditam ser especialistas em qualquer assunto.

 

Os problemas resultantes desse comportamento, obviamente, são gigantes. Notícias propagadas pelo Facebook ou pelo Twitter, até mesmo em função da celeridade que a rede social parece exigir (“Preciso ser o primeiro a postar!”), muitas vezes revelam-se infundadas, até mesmo inverídicas. Exceto em (raros) casos de veículos que ainda seguem os preceitos básicos do jornalismo, é comum os responsáveis pelas postagens pularem o fato crucial da checagem das informações, publicando notícias sem qualquer base real – e, claro, as pessoas acabam compartilhando tais fatos também sem verificação, criando uma bola de neve da mentira. Além disso, salvo exceções, notícias criadas para as redes sociais são caracterizadas pela superficialidade, para a compreensão rápida de leitores com preguiça ou incapacidade de se concentrar, o que leva à formação de opiniões rasas e irrefletidas.

 

Porém, o grande mal de tratar as redes sociais como fontes de informações jornalísticas é outro. Ei-lo: no Facebook ou no Twitter, nossa timeline é filtrada. Esse filtro, no entanto, não é feito com o critério de uma editoria jornalística, que (num mundo ideal) seleciona as pautas mais relevantes à sociedade, mas com nossa visão de mundo. Nas redes sociais, só recebemos aquilo com o qual concordamos. Curtimos páginas de personalidades que admiramos, seguimos o perfil de políticos que representam nossas ideias. É muito raro alguém receber postagens de quem discorda. Se você é fã de Jair Bolsonaro, provavelmente não vai seguir a Fan Page de Jean Willys. Se é seguidor de Dilma e Lula, duvido que receba em sua timeline as atualizações da revista Veja. Se é ateu, vai passar longe de publicações religiosas. Esse extremismo não é difícil de ser comprovado; basta lembrar de algum amigo ou parente que tenha bloqueado alguém com opiniões contrárias.

 

Essa forma de agir tem um nome: “viés da confirmação”. Trata-se de um fenômeno já citado por grandes pensadores, como Dante Alighieri e Francis Bacon, e comprovado cientificamente pelo psicólogo Francis Wason em um experimento nos anos 60. Basicamente, em resumo, Wason concluiu que existe em cada um de nós uma tendência natural a buscar fatos que comprovem nossas opiniões, e ignorar evidências em contrário. Ou seja, somos muito mais interessados em informações que ratifiquem o nosso modo de pensar, enquanto aquelas que discordamos são deixadas de lado – mesmo significativas.

 

Portanto, se você age dessa forma, seguindo apenas personalidades que corroborem sua visão de mundo, não se sinta culpado: é natural em nosso comportamento. Mas, ao mesmo tempo, é muito perigoso. Quando se adota essa atitude, o resultado é um alienamento cada vez maior, uma vez que somos bombardeados sempre por um modo unilateral de pensar. A capacidade de raciocínio e de argumentação fica estagnada, já que não recebemos informações novas, mas apenas aquelas que conhecemos e que fazem bem ao ego. Como consequência, o outro, aquele que tem opiniões diversas, torna-se uma figura incompreensível, um idiota equivocado, um inimigo, pois nem ao menos tentamos compreendê-lo ou entender as razões que o levam a pensar de maneira diferente. E, ultimamente, viramos aquilo que desprezamos no outro: um fanático cego e intolerante.

 

Essa pode ser uma característica do mundo digital de hoje, mas ainda é algo que podemos combater. Basta cada um de nós, ocasionalmente, ler textos de quem tem uma visão de mundo totalmente oposta da nossa. Basta acompanhar um pouco da vida de quem é e pensa diferente. Basta trazer novos ingredientes à sua timeline, curtindo páginas e seguindo perfis de pessoas que não admira, mas que ainda representam uma grande parcela da população. Isso terá apenas dois resultados, ambos extremamente benéficos: ou você irá, pelo menos, conhecer um pouco mais sobre o mundo e as pessoas, ou terá ainda mais convicção de suas opiniões.

 

Abrir um pouco a cabeça sempre faz bem.

 

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“Uma vez adotada uma opinião, o entendimento humano busca tudo à sua volta para concordar com ela e apoiá-la. Mesmo que haja um número maior de evidências em contrário, ele as negligencia ou despreza, ou de algum modo as rejeita e deixa de lado.”

Francis Bacon

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